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quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

As filosofias de Maurilio

Autora: Natália Cruz (estudante de Jornalismo da UNITAU). Entrevista feita em nov/2017.



As filosofias de Maurílio

Professor relembra momentos de sua carreira religiosa e profissional 

Fotografia:  Kas Hoshi.

“Ser educador é uma missão elevada e revolucionária, é um processo de correção dos caminhos”, é dessa forma que Maurílio José de Oliveira Camello, natural de Mariana, Minas Gerais, relata o início de sua vocação como professor ao longo de mais de 70 anos de história, incluindo seu período de sacerdócio, onde lecionou em diferentes cidades, enfrentando as dificuldades da época.
Maurílio logo inicia a conversa falando de Mariana, com carinho em seu semblante. Sua cidade natal, apesar da tragédia que ficou conhecida, o faz relembrar sua infância ao lado dos irmãos nos arredores de Bento Rodrigues, onde além de brincar, se tornou coroinha na igreja, vocação que já começava a aparecer desde muito cedo.
Originário de uma família humilde, por vontade própria decidiu se integrar ao Seminário Menor com onze anos de idade, onde cursou o ensino fundamental e médio durante seis anos. “O seminário era uma casa de formação muito conceituada, de alta qualidade, onde abrigava as crianças que queriam seguir a vida religiosa. Ou que achavam que queriam”, conta o mineiro esboçando sorrisos.
Ao completar dezessete anos, se mudou para Petrópolis, no Rio de Janeiro, com o objetivo de se tornar sacerdote de uma congregação e missionário, que despertou muito orgulho em seus pais. “Minha família fez gosto pela minha escolha. Éramos pobres, portanto, para um pai e uma mãe ver seu filho seguindo esse caminho religioso, dava mais segurança. Era uma coisa lendária e importante.”
Chegando a seu destino, Camello passou cerca de oito anos cursando Filosofia e Teologia, ficando um longo período longe dos pais e de seus dez irmãos, que na época não possuíam recursos financeiros para visitá-lo em outro Estado. “Foi um momento difícil, muito penoso. Uma família grande do interior, naquela época, anos 50, não existia transporte como hoje, apenas trem.”, recorda.
A vida foi sendo guiada pelos seus ensinamentos e estudos após sua formação. Foi professor de latim e português, até o colégio que lecionava pegar fogo, destruindo além da estrutura, os sonhos de todos aqueles jovens professores. Desempregado, viu a luz no fim do túnel ao conseguir uma oportunidade única - morar em Roma. O respeito e admiração pelo Vaticano, que já era grande, se tornaram ainda maior ao se integrar na Universidade Gregoriana, onde se formou em História do Cristianismo.
Após os períodos de especialização, Maurílio voltou ao Brasil decidido a abdicar, ou “secularizar” - como o próprio denomina - a carreira de padre.
“Passei por uma crise pessoal, onde vi que não conseguia segurar a ‘barra’ que precisava para continuar. Pretendia segui-la [doutrina] pela vida toda, mas acabei tomando essa decisão por vontade própria”, explica.
Se a desistência poderia parecer algo espantoso para todos ao redor, o destino reservava mais surpresas. Ele se apaixonou e logo casou. Sua esposa, também professora, já tinha três filhos, e após um período se tornou pai pela primeira vez. “Tornei-me um homem da vida civil e foi uma ótima experiência. A paixão, sem dúvidas, me fez cometer essa loucura”, comenta de forma espontânea.
Com a responsabilidade de oferecer uma vida estável, precisou mudar de cidade, pois continuou lecionando, passando por São Paulo, Santos, depois em Brasília e Belo Horizonte. “Eles se mudaram por conta do meu trabalho, não havia um lugar fixo, tivemos que nos adaptar na marra em cada localidade.”, ressalta.
Como o período da ditadura militar foi cercado de muita censura e temor pelos educadores da época, especialmente para aqueles que falavam de História, Filosofia ou Sociologia, os conteúdos eram restritos. Mesmo assim, o mineiro seguia trabalhando. “Determinados assuntos não podiam ser citados, mesmo despertando dúvida e curiosidade nos alunos.”, explica.
Entretanto, a angústia de perder o trabalho era sempre presente, visto que suas aulas eram vigiadas e acompanhadas pelo diretor e por militares, resultando em uma sensação de instabilidade. “Com quatro crianças, despesas grandes... Foi um desafio preocupante.”
Apesar dos obstáculos, deixar a área da educação nunca passou por sua cabeça. É visível que o dom que Maurílio leva até hoje, é alimentado de amor.
Passando onze anos na Universidade de Taubaté e atualmente ministrando aulas na Faculdade Dehoniana, alunos param nos corredores da instituição para conversar ou receber um abraço afetuoso - o afeto é retribuído, contudo, prefere não ser adepto a menção honrosa de “mestre” ou “doutor”; se considera um ser humano comum, porém, sem perder a cordialidade facilmente percebida.
“Ele, além de excelente educador, é um amigo sempre próximo e solícito aos estudantes. Muitos, incluindo em grande parte ex-alunos, veem nele uma figura inspiratória.” afirma o aluno Douglas Jefferson.
Mesmo possuindo grandes experiências, tudo isso só importa para Camello se houver uma troca real. “Eu faço diferença entre ser educador e professor. Sempre estudei, porém, ser professor agora virou algo técnico. O educador, para mim, tem uma missão de caráter espiritual com o educando”.
Com 77 anos - completando mais um ano de vida no próximo mês de dezembro - e com uma alma jovial apreciadora de poesia, teatro e música, Camello diz que sabe que a hora da parar já passou. Todavia, acentua que o que lhe move é ensinar. “Já estou idoso. Mas sinto um brilho humano, a possibilidade de guiar caminhos através da educação que posso transmitir".

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