ENTREVISTA com Maria Luiza Jobim: cantora lançou seu primeiro álbum solo
9 de maio de 2020
DOUGLAS: Primeiramente, muito obrigado por nos ceder entrevista. Ficamos
realmente contentes – enquanto leitores e enquanto fãs. Como tem passado a
quarentena?
MARIA
LUIZA JOBIM: É um prazer :) muito obrigada pelo espaço
e carinho!
Tenho
passado a quarentena no mato, então, por si só, já é um enorme privilégio. O
isolamento, de alguma maneira, não é tão diferente da rotina do compositor. Meu
universo já gira muito em torno da minha casa; eu faço meus próprios horários,
sou dona do meu tempo. Isso pra mim é liberdade. Nunca fui “rueira”.
DOUGLAS: Seu novo álbum é impecável. Gostei de absolutamente todas
as faixas. Parabéns! Pode nos contar um pouco sobre o processo de composição? As
letras são de sua autoria?
MARIA
LUIZA JOBIM: Nossa! Muito obrigada :)
Meu
processo vem de maneiras diferentes. Às vezes, começo pela letra, mas, na
maioria, pela melodia ou clima/arranjo. Gosto muito de pensar na composição
como um todo. Como se ela já estivesse ali e eu vou descobrindo-a; não sei se
isso é muito explicável hehe. Não tem muita ordem ou hierarquia, tipo letra,
depois harmonia, depois melodia, por exemplo... Eu imagino um som, e daí penso
“dá pra fazer isso com sintetizador” e combina com uma voz com “essa textura” e
falando essa e tal coisa... Hehe e por aí vai. Um pouco caótico, mas funciona. Eu
tenho duas músicas que fiz sozinha no disco e as outras fiz com meus parceiros
incríveis: Lucas Vasconcellos, Cris Caffarelli e Lucas de Paiva.
DOUGLAS: A primeira faixa, Casa Branca, nos leva para dentro de
suas memórias de infância. Como foi transformar essas imagens em música?
MARIA
LUIZA JOBIM: Hehe acho que a resposta anterior
praticamente entrega essa. Eu gosto muito de pensar na imagem da coisa. Sinestesia
mesmo. Misturo os sentidos. Foi maravilhoso esse mergulho nessa casa e é muito
forte como você consegue, através da música, passar vivências que as outras
pessoas reconhecem nas próprias vidas. Isso foi lindo.
DOUGLAS: No que se refere ao ritmo, quais foram as suas maiores
referências para a criação do álbum?
MARIA
LUIZA JOBIM: Eu tenho muitas referências, escuto muita
música, digo. Mas, no álbum, no que se diz respeito a gênero musical, não foi
muito uma preocupação específica. Era um álbum que eu queria falar sobre um
tema. As músicas giravam em torno desse universo e eu entreguei a produção ao
Kassin, que fez lindamente.
DOUGLAS: A sexta faixa, Meditation, é um dos maiores clássicos de
seu pai, Antonio Carlos Jobim. Por que escolheu especificamente essa canção
para integrar o álbum? E por que a versão em inglês?
MARIA
LUIZA JOBIM: Eu tenho um carinho especial por essa
música, especificamente a versão em inglês, por lembrar dele tocando no piano. E
não poderia deixar de faltar uma canção dele, onde tudo começou. A escolha foi
muito natural pra mim.
DOUGLAS: Para encerrar, como é de costume aqui no blog, pode
indicar aos nossos leitores alguns dos seus filmes e livros favoritos? O que
tem lido ultimamente?
MARIA LUIZA JOBIM: Claro!
De livros, eu recomendo todos do japonês Haruki Murakami. E os dois últimos
filmes que vi e amei foram Dor e Glória do Almodóvar e Parasita.
Casa Branca (2019)
Nota pessoal: 9,2
(excelente)
Gênero: Synth-pop;
MPB. Produção: Kassin.
1. "Casa Branca"
2. “Corpo e Calor"
3. "Sonhos"
4. "22º Andar"
5. "Fotossíntese"
6. "Meditation"
7. "Incêndios"
8. "Antonia"
Casa Branca, primeiro álbum solo de Maria,
é delicado, íntimo, eletrizante, cativante, sereno, terno, poético, nostálgico.
São inúmeros os adjetivos que podemos usar para descrever a obra. No todo, o
disco embarca o público em uma viagem onírica, como um mergulho em sonhos,
apresentando imagens, sensações e sons que dialogam com uma vibe
oitentista e, ao mesmo tempo, futurista, o que cria um misto interessante.
Somos norteados pela lindíssima voz de Maria. Seguimos suas lembranças, seus
desejos, sua poesia; conhecemos seu passado, sua vida e até mesmo sua filha,
Antonia, homenageada na última faixa.
O ritmo, muitas vezes, assemelha-se ao
chamado bedroom pop, que remete à música independente, criada no
aconchego do quarto. Costuma ser um gênero associado ao lo-fi, com
batidas eletrônicas e sintetizadores, muito em voga hoje em dia. Essa
preferência de fundo instrumental ajuda a construir a atmosfera surrealista.
Por vezes, os sintetizadores nos puxam para o futuro, denotando a tecnologia
que há em cada música; além de conjurar luzes e cores em nosso espírito.
Regendo as batidas e os efeitos eletrônicos, o vocal nos puxa para o passado,
para detalhes e imagens de rotina, conforto, intimidade.
Começamos o disco com a canção homônima, Casa
Branca. O hit já conta, até o momento, com mais de 112 mil acessos
no Spotify, e abre o baú de infância das memórias da artista. Somos
convidados a conhecer a casa onde Maria viveu até os seus 14 anos, no Jardim
Botânico do Rio. Na sequência, Corpo e Calor, balada dançante que
trabalha a ideia de que “somos nosso próprio lar”, como diz a letra. Ela fala
sobre amor e lar, basicamente. Sonhos, por sua vez, narra o conforto da
presença da pessoa amada por meio de uma aura musical onírica. 22º Andar,
quarta faixa, é a minha favorita, muito provavelmente. Ela se inicia com um som
ambiente de murmurinho e trânsito urbano e parte conosco para o interior de um
táxi, junto de Maria. Há uma vibe futurista e intimista. A poesia da
artista nos permite conhecer um pouco do interior de seu eu-lírico, suas
reflexões e seus anseios.
Em seguida, Fotossíntese abre um
novo leque na musicalidade do disco. A canção é agitada, alto-astral, com um
baixo eletrizante e um vocal que flana por céus ensolarados, a praia e o mar. O
tom futurista volta a aparecer aqui, em efeitos sonoros. Meditation vem
logo a seguir, onde podemos apreciar o talento de Maria na interpretação da
versão inglesa, escrita por Norman Gimbel, da eterna Meditação, de Tom
Jobim e Newton Mendonça. O arranjo traz uma roupagem elegante ao clássico e
privilegia o acústico em oposição ao eletrônico, que fica em segundo plano.
Minha parte favorita é quando Maria canta “Yes, I love you so”, onde sua
voz, enfeitada, alcança o sublime e os nossos corações.
Incêndios, penúltima faixa, é outra boa surpresa: começa
minimalista, com fortes graves e estalos, para ganhar um volume poderoso de
sintetizadores. Na letra, a poesia conduz nossa imaginação: “Tudo o que nos
move / a sede, a guerra, a estrada de terra / Não sei por onde leva / Eu sou o
barco, o vento e a vela”. Para encerrar, Antonia fecha o disco com perfeição.
Composta em homenagem à filha, a canção é uma espécie de canção de ninar
transbordante em ternura de mãe. É o amor materno, em seu grau mais delicado,
transposto em música.
Ouçam o álbum e se permitam a viagem.
Maria Luiza Jobim tem tudo para continuar trilhando uma carreira
extraordinária. Este disco e o seu talento nele demonstrado são a prova.
Foto:
Guilherme Nabhan.
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Siga Maria Luiza Jobim no Instagram: @marialuizajobim
Veja o videoclipe de Casa Branca:
Ouça o álbum completo no Spotify:
¹ Entrevista ao programa Cultura Livre da TV Cultura, em 1 de fevereiro de
2020.
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